O mínimo de se esperar da minha parte é esperar nunca mais
me deparar com aquele garoto, Matheus, que diz que o tempo cura. Aquelas
palavras não saiam da minha cabeça, assim como ele não saia do meu lado, todo o
enterro. Eu não o via, mas sabia que ele estava lá, logo atrás de mim, me
observando. Alguém me cutucou e me perguntou quem era aquele que tinha
aparecido junto comigo. Ninguém o conhecia, uma parte de mim queria acreditar
que fora um anjo que aparecera para me consolar. Poderia ser um anjo, já que nunca
vira nenhum, na verdade esse tal de Matheus poderia ser qualquer coisa, já que
não o conhecia. Mas eu simplesmente
respondi:
_Eu não sei – e não mais me incomodaram me perguntando.
Eu olhava aquela caixa de madeira gelada e fúnebre e pensava
no tempo que custaria para me curar, na cura que eu não gostaria de ter, em
tudo que eu abriria mão para não ter que passar por aquele momento, tudo o que
eu queria é que nada naquilo tivesse acontecido. Quem sabe se eu não estivesse
lá com ele? Poderia eu ter sido a causa dessa tragédia? E eu começava a pensar
em cada segundo que poderia ter feito diferença, cada segundo que faria com que
tudo fosse diferente.
A última palavra tinha sido dita. Aquela caixa de madeira
que há horas me encarava para terra foi, para sempre. Ou será que não? Na
verdade eu não fazia ideia do que acontece com os caixões e os defuntos. E não
conseguia pensar na ideia de que ele estava morto. Ele estava vivo, bem ao meu
lado, falando comigo até ser interrompido. Foi aí que lembrei de suas últimas
palavras, as quais não falei com ninguém, talvez isso tornasse mais difícil do
que já é para todos. Será que ele sabia que aquilo era o fim? Não era possível
algo desse tipo. Eu devo ter sonhado com essas últimas palavras dele, afinal,
todo aquele dia foi muito intenso pra mim, eu mal tinha dormido e não fazia
ideia de como tudo acontecera depois, de como tinha ido parar no hospital e
depois no carro, estava tudo tão confuso na minha cabeça.
Aquela confusão me tomou de tal maneira que não reparei que
aos poucos as pessoas iam embora. Era um momento embaraçoso, como saber que
hora partir? E eu me perguntava se ele sabia. Eu não sabia quando teria que
sair dali, e não conseguia imaginar para que lugar poderia ir depois daquilo.
Eu tentava me lembrar dos momentos bons, para quem sabe
assim me anestesiar daquela dor, mas daí me lembrei que não haveriam outros.
Tudo o que eu conseguia pensar era que eu nunca mais conseguiria ser feliz.
Sempre haveria algo faltando. Como eu poderia ousar sorrir de novo com todas
essas lembranças às minhas costas? Eu me sentia a primeira e a única do mundo
passando por uma situação como aquela.
Hoje lembrando de tudo que passou pela minha cabeça naquele
dia me sinto tão estúpida e egoísta e ao mesmo tempo entendo a minha dor. Eu
tinha só 14 anos, como poderia saber como lidar? Haveria um manual em algum
lugar do mundo? Será que era possível aprender a lidar com aquela situação?
Sim, aquela, pois não há palavras suficientes no mundo para explicar isso. Essa
dor minha, que só eu senti e mais ninguém, que não é maior ou menor que a de
qualquer pessoa, mas que era minha e tinha meu nome e o dele estampado e
tatuado para sempre.
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